Vou te contar a história de uma escola que transformou um problema em oportunidade. O canteiro lateral, que antes acumulava entulho e mato, hoje é o espaço mais disputado pelos alunos durante as aulas.
Mas esse resultado não veio do acaso, e sim de um planejamento arquitetônico pensado para integrar educação ambiental com funcionalidade pedagógica.
Segundo uma notícia da Secretaria de Educação de Mato Grosso, o Projeto Hortas Escolares contemplará 300 unidades estaduais de ensino em 2024, destinando investimentos de R$ 3 milhões.
Cada escola receberá R$ 10 mil para aquisição de ferramentas, sementes e insumos necessários à produção de alimentos orgânicos, demonstrando como o poder público reconhece o valor pedagógico desses espaços.
O canteiro que ninguém olhava
Quando a diretora nos procurou, ela apontou para uma lateral da escola com certa frustração. Ali existia um espaço de cerca de 60 metros quadrados que, em teoria, deveria ser uma horta. Pelo menos era o que dizia um canteiro improvisado com tijolos empilhados e terra compactada.
“Já tentamos três vezes fazer dar certo. Plantamos, as crianças se empolgavam, mas depois de alguns meses tudo morria. A equipe desanimava, os pais reclamavam do mato crescendo, e voltávamos à estaca zero”, contou ela.
Olhamos ao redor e identificamos rapidamente os problemas. O local recebia sol pouquíssimo tempo por dia, não havia sistema de irrigação, o solo estava completamente esgotado.
Além disso, não existia integração entre o canteiro e o projeto pedagógico da escola, então a horta era vista como uma obrigação extra, não como ferramenta de ensino.
Os erros que impediam o projeto de funcionar
A primeira tentativa da escola havia sido feita com boa vontade, mas sem conhecimento técnico.
Professores e funcionários se reuniram em um sábado, compraram mudas prontas em uma agropecuária e plantaram direto na terra existente. Ninguém analisou o solo, não houve preparo de canteiros adequados e escolheram espécies incompatíveis com o clima local.
Resultado: em dois meses, metade das plantas tinha morrido. As sobreviventes cresciam fracas e não produziam nada aproveitável para a alimentação escolar. As crianças perderam o interesse rapidamente quando perceberam que cuidar da horta não gerava resultados visíveis.
Na segunda tentativa, contrataram um jardineiro para fazer a manutenção. Porém, sem projeto arquitetônico que integrasse a horta ao sistema hidráulico da escola e sem planejamento de longo prazo, os custos se tornaram insustentáveis.
Após seis meses, a escola descontinuou o contrato e o canteiro voltou ao abandono. A terceira vez foi com uma empresa de paisagismo, que criou canteiros bonitos, mas completamente inadequados para o uso pedagógico.
As crianças não conseguiam alcançar as plantas, não havia espaço para circular entre os canteiros e o projeto desconsiderou totalmente a rotina escolar. Mais uma vez, frustração.
O momento de buscar especialização
Foi quando a coordenadora pedagógica sugeriu procurar profissionais especializados em arquitetura escolar. “Percebi que não era apenas sobre plantar. Era sobre criar um espaço educativo que realmente funcionasse”, explicou ela.
Ao analisarmos o caso, propusemos uma abordagem completamente diferente. Primeiro, estudamos os fluxos da escola e identificamos os horários disponíveis para atividades ao ar livre.
Depois, fizemos uma análise completa do terreno. Identificamos áreas com melhor insolação, projetamos sistema de captação de água da chuva conectado às calhas do prédio, e criamos canteiros no solo e elevados na altura adequada para crianças de diferentes idades.
Também incluímos áreas de circulação seguras, bancos para observação e um pequeno cômodo para armazenamento de ferramentas.
A transformação em laboratório vivo
O projeto final transformou aquele espaço abandonado em três zonas distintas.
A primeira, com canteiros de hortaliças de ciclo curto, permitindo que as turmas acompanhassem todo o processo desde a semeadura até a colheita em um bimestre letivo. Alface, rúcula e rabanete foram as escolhidas iniciais.
A segunda zona recebeu plantas perenes e aromáticas. Hortelã, manjericão, alecrim e cebolinha ficaram disponíveis durante todo o ano, garantindo que sempre houvesse algo para colher, mesmo nas férias escolares. Além disso, reduzem a manutenção necessária.
A terceira área foi destinada à compostagem e à educação ambiental. As crianças aprenderam a transformar restos orgânicos da merenda em adubo, fechando o ciclo de sustentabilidade e dando sentido prático aos conceitos de decomposição e nutrientes do solo.
Incluímos também sinalização educativa com placas ilustradas, onde as professoras inserem as etapas do crescimento das plantas, os benefícios de cada espécie e curiosidades botânicas. Os canteiros viraram verdadeiras salas de aula ao ar livre.
Os resultados após seis meses
Seis meses depois da implementação, voltamos para avaliar os resultados. A diferença era impressionante.
As crianças não apenas cuidavam da horta, como disputavam qual turma colheria mais naquela semana. Professores relataram que os alunos com dificuldade de concentração em sala melhoraram significativamente durante as aulas práticas na horta.
Além disso, a horta virou cartão de visitas da escola. Durante matrículas, famílias visitavam o espaço e se encantavam com a proposta pedagógica diferenciada. A diretora relatou aumento nas matrículas no ano seguinte, atribuindo parte desse crescimento ao projeto da horta.
Outro resultado inesperado foi o engajamento das famílias. Pais compartilharam conhecimentos com as crianças, criando trocas intergeracionais riquíssimas. Avós ensinaram receitas com as ervas colhidas, integrando a horta também ao resgate cultural.
Lições aprendidas no processo
A principal lição foi entender que a horta escolar não é apenas jardinagem. É arquitetura pedagógica aplicada. Cada detalhe precisa considerar a rotina escolar, as limitações de tempo dos professores, a segurança das crianças e a viabilidade de manutenção a longo prazo.
Outra descoberta importante foi a necessidade de integração com outros projetos da escola. A horta funcionou porque conectamos com projetos flexíveis e moduláveis, permitindo adaptações conforme as necessidades pedagógicas de cada turma e período letivo.
Também aprendemos que o sucesso depende de infraestrutura adequada. Irrigação, ferramentas apropriadas para o tamanho das crianças, canteiros acessíveis e espaço de armazenamento fazem diferença entre um projeto sustentável e mais uma tentativa frustrada.
Por fim, constatamos que a participação ativa das crianças desde o planejamento aumenta drasticamente o senso de pertencimento. Quando os alunos ajudam a decidir o que plantar, sentem-se responsáveis pelo sucesso da horta e engajam naturalmente na manutenção.
Transforme espaços abandonados em aprendizado
Cantinhos abandonados, laterais subutilizadas, áreas sem função definida: toda escola tem espaços que podem se transformar em ferramentas pedagógicas poderosas. A questão não é ter ou não ter terreno disponível, mas sim saber projetar adequadamente para as necessidades específicas de cada instituição.
Cada solução é única, pensada para funcionar dentro da realidade da sua escola, sem criar sobrecarga para a equipe ou frustração para as crianças.
Tem um cantinho abandonado na sua escola? Vamos conversar sobre o que é possível fazer ali e transformar problemas em oportunidades de aprendizado vivo para os seus alunos.
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